Com participação de três intérpretes catarinenses: Ju Passos, Camélia Martins e Cadu Duarte, o cantor e violonista Luiz Meira e banda fizeram uma homenagem à vasta obra de Chico Buarque, rica em sentimentos, crítica social e denúncias.
Texto Duda Hamilton
Acompanhada de don Pablo e com a alma lavada pelos 4 x 1 no STF, no dia 11 de setembro, assisti "Cotidiano - Chico Buarque por Luiz Meira e convidados", na última sexta-feira, dia 12, no CIC, confirmando como é corajoso “esse quiridu narigudo do Meirinha". Com sua batida única de mão direita, abraçou o violão e soltou O que será, que será, logo de início, sem tremer. Não foi fácil escolher o repertório, mas foi certeiro em alguns arranjos, como em Meu Guri, com o astral cênico e a potente voz de Ju Passos, e a guitarra do "vovozinho rock and roll Meirinha".
Generoso com seus parceiros, o experiente instrumentista juntou uma banda de talentosos "pratas da casa”: Caio Muniz, no piano, teclado e arranjos; Alexandre Vicente, no contrabaixo; Neno Moura, na bateria; na percussão Rodrigo Campos e no saxofone e flauta Johnny Brion. Não contente, Luiz Meira chamou para dividir o palco e cantar a obra de Chico, a Camélia Martins, a Ju Passos e o Cadu Duarte, além da violinista Iva Giracca. Todos atuando na cena cultural catarinense.
Primeira convidada a subir ao palco, Camélia Martins soltou a voz em Sob Medida e mostrou que é boa no samba e na interpretação em Pelas Tabelas : Quando vi todo mundo na rua de blusa amarela / Eu achei que era ela puxando um cordão / Oito horas e danço de blusa amarela / Minha cabeça talvez faça as pazes assim
Ju Passos entrou impactando em Meu Guri, ponto alto do show, e na sequência interpretou a forte Partido Alto - Deus Dará - Diz que deu, diz que dá / Diz que Deus dará / E se Deus não dá, ó nêga / Como é que vai ficar, ó nega?/ Deus dará, Deus dará. A letra de 1972, em plena ditadura militar, critica a passividade diante da injustiça social e usa ironia e irreverência para retratar a desigualdade do Brasil. Uma canção com a marca Chico Buarque, o político.
O cantor Cadu Duarte chamou a força de Cauby Peixoto e entoou Bastidores - Chorei, chorei / Até ficar com dó de mim / E me tranquei no camarim / Tomei o calmante, o excitante e um bocado de gim. E junto com Meira, a excelente violinista Iva Giracca e o público interpretaram Gente Humilde, única parceria de Chico com Vinicius de Moraes. Teve também o clássico João e Maria, graciosamente tocado por Giracca.
Quem ganhou foi o público, a maioria de cabeça branca, que entrou numa viagem pelo universo genial das composições de Chico Buarque, cantando e se emocionando com Rita; Com Açúcar, com Afeto, música que mais marcou a juventude do cantor e compositor catarinense. Em Trocando em Miúdos, Meira improvisou um solo só para mostrar que está cada vez mais em forma na música instrumental, seu habitat natural.
Para lembrar do tempo de voz e violão, acompanhando Gal Costa, fez uma homenagem com a forte Folhetim - Se acaso me quiseres / Sou dessas mulheres / que só dizem sim / Por uma coisa à toa, uma noitada boa / Um cinema, um botequim.
A inconfundível batida de Meira, seja na guitarra vermelha ou no violão, encantaram a noite também com Cotidiano e a intimista Futuros Amantes, música que colocou no repertório uma semana antes do show, difícil de executar: Não se afobe, não/ Que nada é pra já /O amor não tem pressa / Ele pode esperar em silêncio.
Para fechar o espetáculo em homenagem aos 80 anos de Chico Buarque, todos no palco com a canção Roda Viva, de 1968, ano do Ato Institucional 5, período de maior repressão e insitucionalização da tortura e desaparecimentos. A gente quer ter voz ativa / No nosso destino mandar / Mas eis que chega a roda-viva / E carrega o destino pra lá.
Foi de arrepiar e só faltou para fazer uma homenagem perfeita ao compositor e ativista político Chico Buarque, uma palavra de Luiz Meira enaltecendo a Democracia e a Soberania do Brasil. Afinal, pela primeira vez um ex-presidente da República e militares são condenados à prisão. Faltou o grito final #SEMANISTIAPARAGOLPISTAS. Chico é um genial compositor e cidadão! Meira fez uma homenagem à altura, mas não entrou na política.